Presidenta Dilma Rousseff
(Foto: Roberto Stuckert Filho/PR)
A presidenta Dilma Rousseff falou por duas horas ao portal GGN, em
entrevista exclusiva. Garantiu que o Brasil está “em obras”, se preparando para
os próximos vinte anos. A entrevista aborda o futuro, fala do legado que
a presidenta pretende deixar para as novas gerações e revisita o que já foi
feito, como os programas Bolsa Família, Minha Casa, Minha Vida e Luz para
Todos.
Ela se empolga com a nova lei dos portos e de como a reserva do campo de
Libra impactará o país. Garante que sua próxima frente de batalha será a
educação. Ela deixou claro que defende que os royalties do petróleo sejam
destinados para o setor.
Leia a íntegra da entrevista:
O novo país
GGN – Que país a senhora pretende que nossa geração entregue para a de
nossos netos?
Dilma - Está vindo por aí uma nova geração totalmente diferente,
que encontrará um país totalmente diferente do que nossa geração recebeu. Nós
vamos transformar o Brasil em um país rico, de classe média. Pessoalmente acho
que essa herança ficará não apenas eliminando a pobreza, mas conseguindo uma
educação de altíssima qualidade. Só a educação permite um ganho permanente,
irreversível. Por isso defendo os royalties para educação.
GGN – Qual a próximo ciclo da economia?
Dilma – A etapa do combate à miséria absoluta está prestes a terminar.
Hoje em dia, existe o Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida, o apoio ao
microempreendedor, o Luz Para Todos. Essa foi a primeira grande leva de
transformações e só tem dez anos. Os frutos ainda nem começaram a aparecer. A
segunda grande leva será a busca da competitividade.
GGN – E as frentes da próxima batalha?
Dilma – A principal é a Educação, que serve ao lado social e à
competitividade. Há um amplo investimento no Prouni (Programa Universidade para
Todos), no FIES (Financiamento Estudantil), na ampliação das escolas técnicas,
de universidades e novos campis. E na interiorização da educação. Levar a
educação para o interior muda padrão de vida de toda uma região.
Os analistas ainda não se deram conta da extensão do trabalho em
educação. Financiamos R$ 1,5 bilhões para o Senai ampliar a formação de mão de
obra. A Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego) da
CNI (Confederação Nacional da Indústria) irá formar 8 milhões de trabalhadores
até 2014. O MEC (Ministério da Educação) está entrando com recursos para
formação de técnico para nível médio.
A parte relevante é o treinamento de mão de obra com vários escalões,
até chegar à Tereza Campello (do Ministério do Desenvolvimento Social). Há
várias turmas de filhos do Bolsa Família se formando. Já chegam a um milhão de
alunos.
Essa mesma parceria do Senai estamos fazendo com o Senar (da
Agricultura) e com o Senac (do Comércio). O Senai e o Senar são os parceiros
mais ativos.
O mais interessante é a quantidade de mulheres que saem do Bolsa Família
e se tornam operárias especializadas. Na cerimônia de formação dos alunos do
BF, a oradora da turma era uma moça que se tornou eletricista.
Os marcos regulatórios
GGN – E a outra frente?
Dilma - A segunda frente são os novos marcos regulatórios. No período
Lula houve o marco do setor elétrico. Depois, o pré-sal. Como se sabia onde
havia petróleo, com risco menor de prospecção, mudou-se a exploração para o
sistema de partilha, para o país beneficiar-se o máximo possível da nova
riqueza.
GGN – E a Lei dos Portos?
Dilma – O marco regulatório dos portos é fundamental. No lançamento
afirmei que seria a segunda abertura dos portos. A primeira, de Dom João VI,
foi para o comércio com as nações amigas. A segunda, agora, é a abertura para o
investimento privado. Há a necessidade de um padrão de eficiência compatível
com a sofisticação industrial, agrícola e a extração de minérios.
No caso dos portos, ampliar os terminais de uso privado, deixar quem
quiser exportar através de container, sem reserva de mercado, e ampliar a
capacidade de comunicação do país com o exterior.
Na sequencia, o desafio será priorizar a cabotagem (navegação da costa).
Um de nossos principais atos foi o de desobstruir a infraestrutura. Todo
mundo tem o direito de passar. Para não penalizar quem faz a infra, quem quiser
passar paga o mesmo que o concessionária cobra de si próprio.
A expansão dos portos abrirá um novo mundo, permitindo a integração com
ferrovias, com o transporte aquaviário.
Hoje em dia, temos condições de planejar estrutura ferroviária, porque
os portos são importantes, porque rodovias estão sendo duplicadas.
Eisenhower, quando assume governo norte-americano, duplicou todas as estradas.
Chefiou as Forças Aliadas na Segunda Guerra. Planejou atravessar a França para
chegar e Berlim em determinado prazo. O planejamento fio em cima da experiência
antiga com as estradas francesas, estreitas. Quando entrou nas autobans, a
chegada em Berlim foi abreviada. Aí ele entendeu a importância das
autoestradas. Levou 15 anos para duplicar as estradas norte-americanas. Nós
duplicamos os principais eixos.
O salto agrícola
GGN – Resolve-se, com isso, o problema do transporte das safras?
Dilma - Ninguém notou muito, mas lançamos recentemente uma política
fundamental, a de armazenagem. Precisamos de 65 milhões de toneladas de
capacidade instalada de armazéns. No último Plano de Safras, foram destinados
R$ 136 bilhões para a agricultura comercial e R$ 21 bi para a familiar. Foram
colocados R$ 5,5 bilhões, a 3% ao ano de juros e prazos de 15 anos, para a
ampliação da rede de armazéns.
Ao mesmo tempo, será recriada uma estrutura de assistência técnica e
extensão rural.
A Embrapa é uma instituição voltada para a pesquisa. A nova organização
será voltada para a assistência técnica, como agência de difusão de tecnologia.
Será enxuta e seu papel consistirá em articular consultorias privadas para
atuar em duas áreas prioritárias: agricultura de precisão e produção de
hortifrutigranjeiros em áreas protegidas (estufas), além de pesquisas em
biotecnologia, nas áreas de DNA, pecuária leiteira.
O campo de Libra
GGN – E a licitação do campo de Libra?
Dilma - Ainda não caiu a ficha geral sobre a próxima licitação do
pré-sal, em 22 de outubro. Será licitado apenas um campo, o de Libra. Dentro da
política da ANP (Agência Nacional de Petróleo), a Petrobras foi contratada para
furar um poço. Fez a prospecção e constatou, inicialmente, uma capacidade
potencial de 5 bilhões de barris equivalente de petróleo. Depois, pegaram os
mapas de sísmica em 3D e enviaram para análises em Londres. Os últimos dados
apontam para uma capacidade de 8 a 12 bilhões de bpe. É algo em torno de 2/3 do
total das reservas brasileiras descobertas em toda sua história.
As análises iniciais indicam um preço bastante competitivo, na faixa de
40 dólares o barril. O gás de xisto dos Estados Unidos, tão falado, não sairá
por menos de 80 dólares.
GGN – Recentemente fizemos em Porto Alegre um seminário sobre a
indústria naval e houve relatos entusiasmados sobre os avanços no setor.
Dilma – Você não sabe a satisfação que é quando se percebe que um
objetivo foi alcançado. Lembro-me que em 2003 o presidente Lula me chamou e
disse que o Brasil já tinha sido um dos maiores produtores de navio nos anos
70. E que queria que voltasse a ser. Fui com a Graça Foster, titular de uma das
secretarias do Ministério, até um estaleiro abandonado.
Era um areal imenso, a perder de vista, sem nada em cima. As pessoas
caçoavam, diziam que seria impossível o Brasil construir navios, que estava
muito acima da nossa capacidade. Ora, construir navios é a capacidade de
transportar chapas e de soldar. Como, impossível?
Hoje, quando volto aos mesmos lugares, vemos guindastes gigantescos, o
estado da arte, equipamentos sofisticados. E com o campo de Libra, vai ser um
salto ainda maior. Haverá uma demanda gigantesca por equipamentos, de 14 a 17
plataformas, exigindo acelerar substancialmente a indústria naval.
GGN – Por que concessões e investimentos demoram tanto a deslanchar?
Dilma - O país paga um preço de 20 anos com austeridade fiscal e baixa
projeção econômica e de investimento. Ninguém passa imune por isso.
As consequências foram a hipertrofia das estruturas de fiscalização em
detrimento da execução. O funcionalismo fiscal tornou-se importante; o de
execução perdeu status e incentivo. Esse fenômeno espalhou-se pelo setor
privado, com os engenheiros de produção cedendo lugar aos engenheiros voltados
para a área financeira e de gestão. Desapareceram as grandes empresas de
consultoria de engenharia.
O planejamento de longo prazo retornou ao país em 2007, com o primeiro
PAC (Plano de Aceleração do Crescimento). Ninguém mais fazia projetos, nem a
União, nem os estados nem a iniciativa privada estavam preparados para
enfrentar o desafio.
De lá para cá houve expressiva mudança qualitativa. Hoje em dia União,
estados e iniciativa privada estão mais aparelhados, as empresas de projetos
são bem melhores, com impacto no ritmo das obras. Houve modificações nos
sistemas de contratação, reduzindo o tempo, melhoria na capacidade de planejar.
GGN – Quando as concessões deslancharão?
Dilma - Na segunda metade do ano, haverá um festival de licitações.
Serão licitados 7.500 km de rodovias, aeroportos, ferrovias, o poço de Libra,
gás em terra, armazéns, linhas de transmissão e geração e o TAV (Trem de Alta
Velocidade). Os empresários internacionais já acordaram para isso.
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